Cristiano Alves
O medo de errar tira a vontade de vencer

No campo da política municipal, decisões equivocadas costumam custar caro. Não apenas em cifras, mas em dignidade, justiça social e, principalmente, oportunidades perdidas. Em Braço do Norte, o recente posicionamento de parte da Câmara de Vereadores contra o avanço de um projeto da Prefeitura que visa à construção de moradias populares em terrenos públicos é mais um capítulo dessa novela repetida em tantas cidades brasileiras: o medo travestido de prudência, a hesitação disfarçada de cautela e, pior, o preconceito camuflado sob argumentos técnicos.
A justificativa apresentada por alguns parlamentares para tentar barrar ou atrasar o projeto – o fato de os terrenos estarem localizados em áreas consideradas de “alto padrão” – diz mais sobre os preconceitos daqueles que deveriam representar toda a população do que sobre qualquer real preocupação urbanística. Afinal, desde quando a geografia urbana de uma cidade deve ser segregada por classe social? O que impede uma família de baixa renda de viver com dignidade ao lado de uma de classe média ou alta? Seria esse o verdadeiro receio: a mistura social?
Em uma de suas frases mais famosas, o técnico de futebol Vanderlei Luxemburgo afirmou: “O medo de errar tira a vontade de vencer.” E não há sentença mais apropriada para traduzir o que se viu no plenário da Câmara de Vereadores de Braço do Norte. Diante de um projeto ousado, inclusivo e promissor – que poderia dar início à construção de moradias populares e, com isso, atacar diretamente o déficit habitacional do município –, alguns preferiram recuar, duvidar, levantar obstáculos e temer a reação dos que se incomodam com o avanço dos menos favorecidos.
A frase de Luxemburgo, embora vinda do futebol, ressoa com força na política: aquele que teme o erro, muitas vezes, sequer entra em campo. E nesse jogo, quem perde é a população.
Mais que isso, a decisão de barrar um projeto com tamanha relevância social revela uma estratégia equivocada – ou pior, a ausência completa de estratégia. No clássico tratado A Arte da Guerra, o general chinês Sun Tzu ensina: “A suprema arte da guerra é derrotar o inimigo sem lutar.” Ora, qual é o “inimigo” neste caso? Seria a desigualdade social, a falta de moradia, a exclusão urbana. E o caminho mais inteligente para vencê-lo é através de ações concretas e eficazes, como a implementação de habitação digna para os que mais precisam.
Ainda em sua obra, Sun Tzu afirma: “Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas.” Infelizmente, parte dos nossos vereadores parece não conhecer nem o adversário que se enfrenta – a desigualdade estrutural –, tampouco a si mesmos: representantes de um povo plural, com realidades diversas e direitos iguais.
Recusar ou atrasar um projeto de moradia popular sob o argumento de que os terrenos estão em áreas nobres é repetir, em 2025, práticas e pensamentos do século passado. É reafirmar, com outras palavras, que os pobres devem ficar “em seu lugar”, longe da vista, dos parques arborizados, dos bons acessos, das escolas bem estruturadas. Trata-se, no fundo, de uma lógica que busca preservar um urbanismo segregacionista, onde o CEP ainda define o valor de uma vida.
Mas Braço do Norte merece mais. E melhor. Uma cidade que se pretende moderna e acolhedora precisa romper com esse tipo de mentalidade. Precisa de líderes que compreendam que políticas públicas de habitação não são esmolas do Estado, mas sim instrumentos de justiça e inclusão social.
Ao preferirem a hesitação e o adiamento, esses vereadores traem não apenas os compromissos com os eleitores mais vulneráveis, mas também os próprios princípios que, supostamente, os colocaram no poder: servir ao interesse coletivo. É um desserviço crasso, especialmente quando o município demonstra, por meio da iniciativa da Prefeitura, estar disposto a enfrentar um dos mais urgentes problemas sociais do Brasil: a falta de moradia.
Importante lembrar que as cidades que deram certo no século XXI foram aquelas que apostaram em uma urbanização mais justa, onde o pobre não é expulso para as periferias distantes e invisíveis, mas integrado ao tecido urbano. Moradia digna em local com infraestrutura, acesso a transporte, emprego e lazer não é luxo – é direito.
Em A Arte da Guerra, há também a lição: “Aquele que não planeja a longo prazo será derrotado.” E o que é habitação, senão planejamento a longo prazo? Cada casa construída é um investimento não apenas em alvenaria, mas em estabilidade familiar, educação, saúde, cidadania. Cada lote ocupado com justiça é uma barreira contra a violência, contra o abandono, contra o colapso social.
É preciso coragem para avançar. E ousadia para vencer. Que os vereadores de Braço do Norte reconsiderem sua postura e compreendam que o erro maior, neste caso, não seria aprovar um projeto ousado – mas deixá-lo morrer por medo, por preconceito ou por conveniência política.
Porque, como bem disse Luxemburgo, o medo de errar tira a vontade de vencer. E se essa cidade quer, de fato, vencer, precisa parar de temer a inclusão social como se ela fosse ameaça – e começar a reconhecê-la como oportunidade.
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